sábado, 16 de março de 2013

VÍCIOS DE LINGUAGEM



A gramática é um conjunto de regras que estabelece um determinado uso da língua, denominado norma culta ou língua padrão. As alterações defeituosas que sofrem a língua em sua pronúncia e escrita devidas à ignorância do povo ou ao descaso de alguns escritores, têm os chamados vícios de linguagem. São eles:

1. Barbarismo: consiste em grafar ou pronunciar uma palavra em desacordo com a norma culta.
pesquiza (em vez de pesquisa)
prototipo (em vez de protótipo)

2. Solecismo: consiste em desviar-se da norma culta na construção sintática.
“Fazem dois meses que ele não aparece.” (em vez de faz; desvio na sintaxe de concordância)
São os erros que atentam contra as normas de concordância, de regência ou de colocação.
Exemplos:

Solecimo de regência:
“Ontem assistimos o filme.” (por: Ontem assistimos ao filme)
“Cheguei no Brasil em 1923.” (por: Cheguei ao Brasil em 1923)
“Pedro visava o posto de chefe.” (correto: Pedro visava ao posto de chefe).

Solecismo de concordância:
“Haviam muitas pessoas na festa.” (correto: Havia muitas pessoas na festa)
“O pessoal já saíram?” (correto: O pessoal já saiu?)

Solecismo de colocação:
“Foi João quem avisou-me.” (correto: Foi João quem me avisou).
“Me empresta o lápis.” (Correto: Empresta-me o lápis).

3. Ambiguidade ou Anfibologia: trata-se de construir a frase de um modo tal que ela apresente mais de um sentido.
“O guarda deteve o suspeito em sua casa.” (na casa de quem: do guarda ou do suspeito?)

4. Cacófato: consiste no mau som produzido pela junção de palavras.
“Paguei cinco mil reais por cada.”      

5. Eco: trata-se da repetição de palavras terminadas pelo mesmo som.
“O menino repetente mente alegremente.”

6. Pleonasmo vicioso: consiste na repetição desnecessária de uma ideia.
“O pai ordenou que a menina entrasse para dentro imediatamente.”
Observação: Quando o uso do pleonasmo se dá de modo enfático, este não é considerado vicioso.

7. Arcaísmo:
Palavras, expressões, construções ou maneira de dizer que deixaram de ser usadas ou passaram a ter emprego diverso.
Na língua viva contemporânea: asinha (por depressa), assi (por assim) entonces (por então), vosmecê (por você), geolho (por joelho), arreio (o qual perdeu a significação antiga de enfeite), catar (perdeu a significação antiga de olhar), faria-te um favor (não se coloca mais o pronome pessoal átono depois de forma verbal do futuro do indicativo), etc.

8. Vulgarismo: É o uso linguístico popular em contraposição às doutrinas da linguagem culta da mesma região.
O vulgarismo pode ser fonético, morfológico e sintático.

Fonético:
A queda dos erres finais: anda, comê, etc. A vocalização do "L" final nas sílabas.
Ex.: mel = meu , sal = saú etc.
A monotongação dos ditongos.
Ex.: estoura = estóra, roubar = robar.
A intercalação de uma vogal para desfazer um grupo consonantal.
Ex.: advogado = adevogado, rítmo = rítimo, psicologia = pissicologia.

Morfológico e sintático:
Temos a simplificação das flexões nominais e verbais. Ex.: Os aluno, dois quilo, os homê brigou.
Também o emprego dos pronomes pessoais do caso reto em lugar do oblíquo. Ex.: vi ela, olha eu, ó gente, etc.

9. Estrangeirismo: Todo e qualquer emprego de palavras, expressões e construções estrangeiras em nosso idioma recebe denominação de estrangeirismo. Classificam-se em: francesismo, italianismo, espanholismo, anglicismo (inglês), germanismo (alemão), eslavismo (russo, polaço, etc.), arabismo, hebraísmo, grecismo, latinismo, tupinismo (tupi-guarani), americanismo (línguas da América) etc...
O estrangeirismo pode ser morfológico ou sintático.
Estrangeirismos morfológicos: Francesismo: abajur, chefe, carnê, matinê etc...
Italianismos: ravioli, pizza, cicerone, minestra, madona etc...
Espanholismos: camarilha, guitarra, quadrilha etc...
Anglicanismos: futebol, telex, bofe, ringue, sanduíche breque.
Germanismos: chope, cerveja, gás, touca etc...
Eslavismos: gravata, estepe etc...
Arabismos: alface, tarimba, açougue, bazar etc...
Hebraísmos: amém, sábado etc...
Grecismos: batismo, farmácia, o limpo, bispo etc...
Latinismos: index, bis, memorandum, quo vadis etc...
Tupinismos: mirim, pipoca, peteca, caipira etc...
Americanismos: canoa, chocolate, mate, mandioca etc...
Orientalismos: chá, xícara, pagode, kamikaze etc...
Africanismos: macumba, fuxicar, cochilar, samba etc...
Estrangeirismos Sintáticos:

Exemplos:
Saltar aos olhos (francesismo);
Pedro é mais velho de mim. (italianismo);
O jogo resultou admirável. (espanholismo);
Porcentagem (anglicanismo), guerra fria (anglicanismo) etc...

10. Obscuridade: Vício de linguagem que consiste em construir a frase de tal modo que o sentido se torne obscuro, embaraçado, ininteligível. Em um texto, as principais causas da obscuridade são: o abuso do arcaísmo e o neologismo, o provincianismo, o estrangeirismo, a elipse, a sínquise (hipérbato vicioso), o parêntese extenso, o acúmulo de orações intercaladas (ou incidentes) as circunlocuções, a extensão exagerada da frase, as palavras rebuscadas, as construções intrincadas e a má pontuação.
Ex.: “Foi evitada uma efusão de sangue inútil.” (Em vez de efusão inútil de sangue)

11. Neologismo: Palavra, expressão ou construção recentemente criada ou introduzida na língua. Costumam-se classificar os neologismos em:
Extrínsecos: que compreendem os estrangeirismos.
Intrínsecos: (ou vernáculos), que são formados com os recursos da própria língua. Podem ser de origem culta ou popular. Os neologismos de origem culta subdividem-se em:
Científicos ou técnicos: aeromoça, penicilina, telespectador, taxímetro (redução: táxi), fonemática, televisão, comunista, etc...
Literários ou artísticos: olhicerúleo, sesquiorelhal, paredro (= pessoa importante, prócer), vesperal, festival, recital, concretismo, modernismo etc...
OBS.: Os neologismos populares são constituídos pelos termos de gíria. "Manjar" (entender, saber do assunto), "a pampa", legal (excelente), Zico, biruta, transa, psicodélico etc...

12. Preciosismo: Expressão rebuscada. Usa-se com prejuízo da naturalidade do estilo. É o que o povo chama de "falar difícil", "estar gastando".
Ex.: "O fulvo e voluptoso Rajá celeste derramará além os fugitivos esplendores da sua magnificência astral e rendilhara d’alto e de leve as nuvens da delicadeza, arquitetural, decorativa, dos estilos manuelinos."
OBS.: O preciosismo também pode ser chamado de PROLEXIDADE.

domingo, 10 de março de 2013

FIGURAS DE LINGUAGEM


Quando manipulamos a linguagem em busca de uma maior expressividade, podemos fazê-la em três níveis: no nível das palavras (pela escolha dos itens lexicais que compõem os enunciados), no nível da sintaxe (em que se estabelece a ordem das palavras no enunciado) ou no nível do pensamento (em que se estabelecem as relações de sentido entre as formas da língua e seu objeto de referência no mundo). Subdividem-se em figuras de palavra, figuras de som, figuras de construção e
figuras de pensamento.

                                    FIGURAS DE PALAVRA

São aquelas que resultam do emprego de uma palavra em um contexto que altera sua significação habitual.

1. Metáfora: quando se constrói uma metáfora, diz-se que houve uma transferência (a palavra grega “metaphorá” significa transporte) de um termo para um contexto de significação que não lhe é próprio. As metáforas baseiam-se, via de regra, em uma relação de “similaridade” (semelhança) que pressupõe um processo anterior de comparação.
A metáfora implica, pois, uma comparação em que o conectivo comparativo fica subentendido.

“A inflação é um monstro adormecido à espreita em todas as esquinas.”

2. Metonímia: ocorre quando se opta por utilizar uma palavra em lugar de outra para designar algum objeto (em sentido amplo) que mantém uma relação de “proximidade” com o objeto designado pela palavra substituída.
Há várias situações em que isso pode ocorrer. Algumas das relações que levam a um uso metonímico de alguma palavra ou expressão manifestam-se quando se toma:

a) A parte pelo todo.
“Ele tem duzentas cabeças de gado em sua fazenda.”

b) O continente pelo conteúdo.
“João é bom de garfo.”

c) O autor pela obra.
“Devolva o Neruda que você me tomou, e nunca leu.” (Chico Buarque e Francis Hime, “Trocando em miúdos”)

d) A marca pelo produto.
“Você me empresta o durex?”

3. Catacrese: na falta de uma palavra específica para designar determinado objeto, utiliza-se uma outra a partir de alguma semelhança conceitual. Entretanto, devido ao uso contínuo, não mais se percebe que ele está sendo empregado em sentido figurado.

“O pé da mesa estava quebrado.”

4. Antonomásia: consiste em substituir um nome por uma expressão que o identifique com facilidade:

“...os quatro rapazes de Liverpool (em vez de os Beatles).”

5. Sinestesia: trata-se de mesclar, numa expressão, sensações percebidas por diferentes órgãos do sentido.

“A luz crua da madrugada invadia meu quarto.”


                                   FIGURAS DE SOM

6. Aliteração: consiste na repetição ordenada de mesmos sons consonantais.

“Esperando, parada, pregada na pedra do porto.”

7. Assonância: consiste na repetição ordenada de sons vocálicos idênticos.

“Sou um mulato nato no sentido lato
mulato democrático do litoral.”

8. Paronomásia: consiste na aproximação de palavras de sons parecidos, mas de significados distintos.

“Eu que passo, penso e peço.”


                                   FIGURAS DE CONSTRUÇÃO

9. Elipse: consiste na omissão de um termo facilmente identificável pelo contexto.

“Na sala, apenas quatro ou cinco convidados.” (omissão de havia)


10. Zeugma: consiste na elipse de um termo que já apareceu antes.

Ele prefere cinema; eu, teatro. (omissão de prefiro)


11. Polissíndeto: consiste na repetição de conectivos ligando termos da oração ou elementos do período.

“ E sob as ondas ritmadas
e sob as nuvens e os ventos
e sob as pontes e sob o sarcasmo
e sob a gosma e sob o vômito (...)”

12. Inversão: consiste na mudança da ordem natural dos termos na frase.

“De tudo ficou um pouco.
Do meu medo. Do teu asco.”

13. Silepse: consiste na concordância não com o que vem expresso, mas com o que se subentende, com o que está implícito. A silepse pode ser:

• De gênero
“Vossa Excelência está preocupado.”

• De número
“Os Lusíadas glorificou nossa literatura.”

• De pessoa
“O que me parece inexplicável é que os brasileiros persistamos em comer essa coisinha verde e mole que se derrete na boca.”

14. Anacoluto: consiste em deixar um termo solto na frase. Normalmente, isso ocorre porque se inicia uma determinada construção sintática e depois se opta por outra.

“A vida, não sei realmente se ela vale alguma coisa.”


15. Pleonasmo: consiste numa redundância cuja finalidade é reforçar a mensagem.

“E rir meu riso e derramar meu pranto.”


16. Anáfora: consiste na repetição de uma mesma palavra no início de versos ou frases.

“ Amor é um fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.”

                                  
                                   FIGURAS DE PENSAMENTO

17. Antítese: consiste na aproximação de termos contrários, de palavras que se opõem pelo sentido.

“Os jardins têm vida e morte.”


18. Ironia: é a figura que apresenta um termo em sentido oposto ao usual, obtendo-se, com isso, efeito crítico ou humorístico.

“A excelente Dona Inácia era mestra na arte de judiar de crianças.”


19. Eufemismo: consiste em substituir uma expressão por outra menos brusca; em síntese, procura-se suavizar alguma afirmação desagradável.

“Ele enriqueceu por meios ilícitos.” (em vez de ele roubou)


20. Hipérbole: trata-se de exagerar uma ideia com finalidade enfática.

“Estou morrendo de sede.” (em vez de estou com muita sede)


21. Prosopopéia ou personificação: consiste em atribuir a seres inanimados predicativos que são próprios de seres animados.

“O jardim olhava as crianças sem dizer nada.”


22. Gradação: é a apresentação de ideias em progressão ascendente (clímax) ou descendente (anticlímax)

“Um coração chagado de desejos
Latejando, batendo, restrugindo.”

23. Apóstrofe: consiste na interpelação enfática a alguém (ou alguma coisa personificada).
“Senhor Deus dos desgraçados!

Dizei-me vós, Senhor Deus!”


sábado, 23 de fevereiro de 2013

FUNÇÕES DE LINGUAGEM:


Toda a mensagem tem uma finalidade predominante que pode ser a transmissão de informação, o estabelecimento puro e simples de uma relação comunicativa, a expressão de emoções, e assim por diante. O conjunto dessas finalidades tem sido entendido sob o rótulo geral de funções da linguagem, que apresentamos a seguir:

1 – FUNÇÃO EMOTIVA ou EXPRESSIVA:

Associa-se diretamente ao EMISSOR. Caracteriza-se pela transmissão de emoções, sentimentos, sensações, opiniões, pontos de vista, julgamentos, etc. relacionados ao sujeito-emissor. Há, como característica básica, embora não necessária, o predomínio da primeira pessoa verbal (EU/NÓS), bem como o emprego frequente de interjeições e exclamações. Podem-se citar como bons exemplos as confissões, as cartas de amor apaixonadas, poemas líricos em primeira pessoa, etc.

2 – FUNÇÃO APELATIVA ou CONATIVA:


É a que se liga ao RECEPTOR no processo da comunicação procurando persuadi-lo, seduzi-lo, convencê-lo, enganá-lo, etc. Há certo predomínio de sujeito-receptor (TU/VÓS, VOCÊS, VOSSA SENHORIA...). Bons exemplos são a linguagem publicitária, a linguagem dos vendedores, as “cantadas” e, em muitos casos, a linguagem dos professores em sala de aula. 

3 – FUNÇÃO REFERENCIAL, INFORMATIVA, DENOTATIVA ou COGNITIVA:

Liga-se ao assunto, ao REFERENTE, ao contexto. Sua característica mais fundamental é a transmissão de informações e conhecimentos. Como exemplos essenciais têm-se a linguagem dos jornalistas, os livros didáticos, aulas, palestras, conferências, etc.

4 – FUNÇÃO METALINGUÍSTICA:

Relaciona-se ao próprio CÓDIGO de comunicação lingüística (VERBAL ou NÃO-VERBAL) que estiver sendo utilizado. Caracteriza-se pela referência da linguagem a si mesma ou pela referência de um tipo de linguagem a outro. Alguns exemplos são a crítica literária, metapoemas (poemas que se referem à própria poesia), dicionários em geral, etc.

5 – FUNÇÃO FÁTICA:

Associa-se ao CANAL da comunicação, verificando se está em funcionamento, ligando-o ou desligando-o. Caracterizam-na mensagens que, única e simplesmente, façam uma espécie de “exame” do canal. Alguns exemplos são saudações e cumprimentos diários como BOM DIA! COMO VAI? TUDO BEM? Chavões telefônicos como ALÔ, ESTÁ ME OUVINDO? POSSO FALAR?

6 – FUNÇÃO POÉTICA:

Liga-se à própria MENSAGEM e se caracteriza pela ênfase da mensagem em si mesma de modo a que seja, ela própria, uma espécie de obra de arte, construída por uma linguagem especialmente elaborada. O melhor exemplo são textos artísticos de modo geral.

Elementos da Comunicação
Funções da Linguagem
contexto (referente)
referencial
remetente
emotiva
mensagem
poética
destinatário
conativa
contato (canal)
fática
código
metalinguística





sábado, 16 de fevereiro de 2013

A LINGUAGEM E ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO


“Palavra puxa palavra, uma ideia traz outra, e assim se faz um livro, um governo, ou uma revolução; alguns dizem mesmo que assim é que a natureza compôs as suas espécies.” (Machado de Assis)

1. Denotação X Conotação:

Estamos imersos em meio a um cotidiano estritamente social, no qual nos interagimos com nossos semelhantes por meio da linguagem. A mesma permite-nos revelarmos nossos sentimentos, expressarmos nossas opiniões, trocarmos informações no intuito de ampliarmos nossa visão de mundo, dentre outros benefícios.
A linguagem humana difere da comunicação animal por envolver um trabalho mental, pois o homem, ao contrário do animal, retém o significado de uma palavra.
A cada mensagem que enviamos ou recebemos, seja esta de natureza verbal ou não verbal, estamos compartilhando com um discurso que se pauta por finalidades distintas, ou seja, entreter, informar, persuadir, emocionar, instruir, aconselhar, entre outros propósitos. Na linguagem humana, assim, uma mesma palavra pode ter seu significado ampliado, remetendo-nos a novos conceitos por meio de associações, dependendo de sua colocação numa determinada frase. Como exemplo, compare os dois casos que seguem:

Ele está com a cara manchada.
“Deus me fez um cara fraco, desdentado e feio.” (Chico Buarque de Holanda)

Pelos exemplos acima, você percebeu que uma mesma palavra pode apresentar variações em seu significado, ocorrendo, basicamente, duas possibilidades:

· Na primeira, a palavra apresenta seu sentido original, impessoal, independente do contexto, tal como aparece no dicionário; neste caso, prevalece o sentido denotativo ou denotação do signo linguístico.
· Na segunda, a palavra aparece com significado alterado, passível de interpretações diferentes, dependendo do contexto em que é empregada; neste caso, prevalece o sentido conotativo ou conotação do signo linguístico.

A linguagem poética explora o sentido conotativo das palavras, num contínuo trabalho de criar ou alterar o significado, já cristalizado, dessas mesmas palavras. Dessa forma, ao interpretar o sentido conotativo das palavras, o leitor transforma-se em leitor-ativo, em tradutor, em co-autor do texto.

2. Elementos da comunicação:

O objetivo de qualquer ato comunicativo está vinculado à intenção de quem o envia, no caso, o emissor. Dessa forma, de acordo com a natureza do discurso presente na relação emissor X interlocutor, a linguagem assume diferentes funções, todas elas portando-se de características específicas. Toda comunicação tem por objetivo a transmissão de uma mensagem, e se constitui por certo número de elementos.
O primeiro linguista a estabelecer funcionamentos (funções) distintos para a linguagem foi o alemão Karl Bühler, determinando a existência de três funções básicas na comunicação: expressiva, informativa e estética. Mais tarde, o linguista russo Roman Jakobson duplicou estas funções baseando-se nos seis elementos que constituem o processo comunicativo, a saber:


EMISSOR: é aquele que envia a mensagem (pode ser uma única pessoa ou um grupo de pessoas).

RECEPTOR: é aquele a quem a mensagem é endereçada (um indivíduo ou um grupo) também, conhecido como destinatário.

MENSAGEM: é o conteúdo (assunto) das informações que ora são transmitidas.

CANAL: o meio material, suporte físico que transporta a mensagem.

REFERENTE OU CONTEXTO: é o objeto ou a situação a que a mensagem se refere.

CÓDIGO: sistema de elementos linguísticos e de regras para combiná-los, conhecido tanto pelo emissor como pelo receptor. Quando se considera a comunicação verbal, o código é uma Língua em sua modalidade oral ou escrita.


quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

IMPRESSIONISMO: EDGAR DEGAS (1834-1917)



“QUATRO BAILARINAS EM CENA” (1885-1890) 
Edgar Degas – coleção MASP

   “Um dos mais importantes pintores impressionistas, Degas (1834-1917) é tema de exposição no MASP, em São Paulo, nesse ano. Reconhecido como o grande mestre das figuras em movimento, Degas é hábil desenhista e um grande inovador na arte do retrato, distinguindo-se pela particular interpretação da luz. Suas técnicas eram originais, enfocando os temas a partir de ângulos incomuns, muitas vezes de um ponto visto de cima. Com um olhar fotográfico, quase sempre posicionava-se de forma descentralizada.” (FGV-2006)

   “(...) Mas é bom avisar que, quanto ao tema das bailarinas, que o senso comum entende indissociável do artista, não foi bem assim. Na realidade, Degas não era um apaixonado por bailarinas, mas pelo movimento, fosse o observado em um espetáculo de balé, uma corrida de cavalos ou uma empregada doméstica passando roupas. O artista fazia até sutilíssimas anotações da mobilidade das expressões faciais, o que tornou excelente retratista.
   Se há hoje uma predominância de bailarinas em sua obra, isso se deve a fatores, digamos, práticos. Degas atendeu a uma demanda do mercado de arte, exatamente quando a fortuna da família (era filho de banqueiro) acabou. Não se imagine, porém, que houve concessões estéticas ditadas pela pressa do lucro. Degas era perfeccionista e, já então, artista consagrado e zeloso de sua reputação. Pintando ou modelando bailarinas, o artista era plenamente consciente de que impulsionava a arte de seu tempo e liderava um movimento. 
   Que razões, porém fazem dessas graciosas personagens algo tão admirado? Uma delas é que há aí o resultado de um olhar moderno, descolado da tradição. Isso fica bem evidente em suas pinturas. Observe o enquadramento, o modo como a cena e os personagens ocupam os espaços da tela. Note que, assim como nas fotografias instantâneas, há figuras parcialmente capturadas no retângulo da imagem.
   O artista parece frisar que a realidade é muito maior, que não cabe inteira na representação possível dela. Observe os ângulos escolhidos para fixar esses instantes. Podem estar em plano aéreo, vendo a cena de cima para baixo, como a platéia dos camarotes de um teatro. Ou podem mergulhar no poço da orquestra para, de baixo para cima, focar o palco como detalhe e os músicos como assunto principal.
   Esses enquadramentos não seriam possíveis se, na época em que foram realizados, a fotografia (inventada em 1839) já não estivesse estabelecendo um novo modo de comentar o mundo. Quanto ao fascínio pelo movimento (Degas foi contemporâneo de Étienne Maray, inventor da cronofotografia, precursora do cinema), cabe lembrar que o artista vivia em uma das maiores metrópoles de um mundo que, graças às máquinas da Revolução Industrial, ganhava um ritmo de vida acelerado. A velocidade passava a dominar a vida urbana e Degas foi dos primeiros a fazer dela um tema artístico.
   De formação clássica, Degas iria adentrar o moderno. Ainda não louvava diretamente as máquinas como o faria, uma geração depois, o Futurismo italiano. O pulso dos novos tempos foi sentido ainda na pele e nos músculos de seus modelos. Era a busca do equilíbrio e do ritmo que o fascinava. Daí as aulas de balé e, na mesma medida, os cavalos de corrida. Um dos seus seguidores diretos, o pintor Toulouse-Lautrec (presente na mostra com quatro obras, todas do acervo Masp) era mulherengo. Degas era até algo misógino. Mas não lhe escapava a fatigante rotina de adestramento a que eram submetidas as bailarinas, assim como os jóqueis e seus cavalos. Começava a emergir aí, nos estúdios sombrios e na poeira das pistas de corrida, um pouco do drama do indivíduo urbano confrontando com a dura rotina do cotidiano." (BRAVO! MAIO 2006)

“Até hoje, Degas tem sabido captar o espírito da vida moderna melhor do que ninguém.”
Edmond de Goncout

    Conhecido como “aquele terrível Monsieur Degas”, o cáustico pintor se opunha a qualquer reforma social e não gostava de crianças, flores e cachorros. “Há o amor e há o trabalho”, ele dizia, “mas nós só temos um coração”. Quase cego e um amargo recluso, dizia: “Quando eu morrer vão ver como trabalhei duro.”
  
   DEGAS, nome real Edgar-Germain-Hilaire de Gás, nasceu em 19 de julho de 1838. A família vivia no padrão burguês de conforto e Degas nunca passou por necessidade financeira, exceto por um breve período após a morte de seu pai.  Bonito, rico, elegante e culto, afetava quase arrogância na compostura um tanto empertigada. De temperamento anti-social, matriculou-se na faculdade de direito da Universidade de Paris, mas passava a maior parte de suas tardes no departamento de reproduções gráficas da Biblioteca Nacional, onde pesquisava e copiava obras dos grandes mestres da pintura. Além de estudar as gravuras, também visitava o Louvre para observar pinturas originais dos grandes artistas.
   Logo sentiu necessidade de ateliê próprio. Seu primeiro professor foi Barrias, substituído pouco tempo depois por Louis Lamothe, discípulo medíocre de Ingres, mas que pelo menos passava a Degas o que aprendia com seu próprio mestre.
   As lições foram fundamentais, pois Degas nunca esqueceu a obra de Ingres, que tanto o influenciou, nem as palavras que dele ouviu num de seus raros encontros: “Nunca desenhe a partir da natureza, meu jovem. Desenhe sempre de memória e segundo o trabalho dos grandes mestres!”
    Talvez seja esse o motivo que, em 1855 Degas após ser aceito na Escola das Belas-Artes, preferiu viajar à Itália e conhecer a paisagem, a atmosfera e as cores que haviam inspirado Giotto, Botticelli, Bronzino, Leonardo, Rafael e Paolo Uccello.
   Os esboços e comentários que registrou nos cadernos de viagem até hoje documentam seu desenvolvimento artístico.
   Entre muitas viagens que fez à Itália, a mais importante foi a de 1858. Foi durante esse período que ele escreveu sobre Luca Signorelli e seu “amor pelo movimento”, sobre o surpreendente senso de drama e expressão de Giotto e sobre a emoção que sentiu quando compreendeu, pelas próprias obras dos grandes mestres, que toda “essa gente possuía muita consciência da vida e não negava”.
   Em Florença, hospedado na casa de uma tia, talvez já tivesse pensado em pintar um retrato da família, pois antes fizera esboços de uma das primas. Anos depois, em seu ateliê em Paris, ele usaria estudos e desenhos feitos naquela viagem para produzir “A Família Bellelli”, o primeiro de um novo gênero de retrato.
   O quadro talvez tenha sido um dos mais modernos da época, em parte pelo nítido contraste entre o rigor do desenho clássico e certos detalhes intencionalmente imprecisos (o tapete e as flores do papel de parede) e, em parte, pelas expressões das figuras.
   As pessoas parecem pegas de surpresa, em poses naturais e a meio pensamento; as posturas não parecem estudadas. Uma das meninas olha o pintor, enquanto o barão está de costas para o observador. É um quadro cheio de energia, mas que enfatiza, na observação cuidadosa das pessoas retratadas, mais a natureza íntima da composição do que seu aspecto imediato.
   Como os velhos mestres, Degas sentia impaciente necessidade de transpor para a tela a experiência pessoal da vida de sua época. Por isso, entre 1860 e 1865, quando estava trabalhando em “A Família Bellelli”, também ia desenvolvendo outros motivos que refletiam seu poderoso desejo de enriquecer a própria vivência. Desenvolveu grandes quadros históricos que eram sua homenagem aos pintores clássicos. Entre eles, “Jovens Espartanos Praticando Exercícos”, “Semíramis Fundando Babilônia”, “A Filha de Jeftá”, “Alexandre e Bucéfalo”, “Cenas de Guerra na Idade Média” ou “Os Infortúnios da Aldeia de Orleans”. O fato é que, embora inferiores às que vieram depois, essas obras impressionam pelo apuro e pela leveza de seus matizes.
   Em 1872, Degas pintou um quadro com fôlego novo: “Nas Corridas”. Degas captou como motivo o momento em que os cavalos estão para largar, nas imagens, a cor se converte em movimento. Os jóqueis no primeiro plano mostram relação visual com os espectadores no plano intermediário, e estes, por sua vez, vão relacionar-se com os cavaleiros de fundo.
   Outro quadro que surpreende se comparado a outros do período, é “Mulher com Crisântemos”, de 1865. Com sua figura tão natural e imediata parece quase fotografia. A mulher, deslocada à direita na composição, está absorta e distante, alheia a quem a observa; o que de fato domina a cena é o vaso de flores.
   Nesse período conheceu Manet e, por intermédio deste, Bazille, Cézanne, Pissarro, Renoir, Sisley e Zola.
   Como Manet, Degas também sentia desejo e necessidade de “pertencer a seu tempo e pintar o que via”. A partir dessa época, empolgado pela ressaca da maré cultural e artística, e influenciado pelas técnicas de Manet, Degas deu à cor função mais decisiva em seu trabalho, passou a usá-la para destacar rostos, pequenos detalhes de um quarto, movimentos de toda uma cena.
   Nem por isso desprezava a precisão dos artistas holandeses ou as regras aprendidas com outros grandes mestres do passado. Inspirava-se também em gravuras japonesas como as do grande inovador Hokusai.
   Em muitos sentidos, Degas estava adiante de época. Inclusive da fotografia, pois vinte anos antes da projeção das primeiras fotografias de um cavalo a galope produzidas por Eadwearch Muybridge, Degas já fizera quadros “de instantâneo”.
   Degas após conhecer a orquestra da Ópera, passou a observar os músicos, o seu trabalho e começou a desenhar o que via.
   Num apontamento para si mesmo, escreveu: “Série sobre os instrumentos e instrumentistas, suas formas, os braços torcidos, os ombros e o pescoço do violinista, por exemplo, as bochechas infladas e os lábios do fagotista, o oboísta...” Tomava nota e pintava.
   “A Orquestra da Ópera” é apenas um título em longa série de quadros que tinham por tema o mundo dos espetáculos, o teatro visto do lado de lá da ribalta, do lado dos que o faziam e o viviam. Depois de reunir muitos desenhos e croquis, ele os arquivava na mente e reconstruía as cenas com realismo; dava às imagens novo senso de espaço e luz. Mas foi só em 1872 que começaram a aparecer grupos inteiros de bailarinas, na barra ou ao espelho, como em “Sala de Ensaio de Balé no Teatro da Ópera.”
   Outro retrato representativo do cotidiano foi o que pintou em 1869, “A Passadeira”.
   “À Beira-Mar”, pastel da mesma época, destoa da temática predominante em Degas, por contrapor indivíduos e natureza. Quanto a isso, ele próprio explicou: “É corajoso representar a natureza em seus grandes planos e linhas e é covarde fazê-lo em facetas e detalhes”. Era uma crítica a outros pintores, um julgamento franco como o que fez a respeito da pintura impressionista ao ar livre: “Um quadro é antes de tudo um produto da imaginação do artista, não deve nunca ser uma cópia. O ar que se vê nos quadros dos mestres não pode ser respirado.”
   Em contraste com Manet, Degas não improvisava. Era impossível para ele se deixar levar apenas por inspiração e impulsos do momento.
   Em 1872, dois anos depois da guerra franco-prussiana, Degas viajou para Nova Orleans. Em Louisiana, começou a retratar diferentes membros da família. Apesar de reunir as figuras do tio e do irmão, “A Corretora de Algodão em Nova Orleans” não tem a mesma atmosfera familiar do retrato da família Bellelli. A cena é a de um escritório na bolsa de algodão e reproduz com realismo quase exasperante a atmosfera de um ambiente de trabalho burguês do século XIX.
   Quando voltou a Paris, Degas fechou-se no ateliê e retomou o trabalho. Embora tivesse exposto com regularidade no Salão todo ano, de 1865 a 1869, ninguém ainda o notara.
   Em 1870 decidiu não inscrever nenhuma obra para a exposição do Salão. Era uma atitude de protesto contra o júri, de cujas ideias discordava, e um ato de solidariedade com um grupo de artistas que, principalmente por pintarem o cotidiano como ele próprio, encontrava sistemática rejeição por parte dos conservadores, o grupo dos “impressionistas”.
   A partir de então, exceto em 1882, Degas participou de todas as exposições anuais dos impressionistas, até a última, em 1886.
   A imprensa acabou por descobri-lo: “A série de novas idéias também se origina da mente de um desenhista, um dos nossos, alguém que já expôs no Salão, homem de raro talento e espírito ainda mais raro”, escrevia Edmond Duranthy.
   Mas Degas não se julgava parte do grupo dos impressionistas, preferia ser chamado de realista: em vez de pinta ao ar livre, preferia o estúdio, onde trabalhava de memória; em vez da tranqüilidade do campão, preferia a cidade buliçosa, com sua vida noturna e mulheres livres.
   Quanto a estas, as que mais desenharam e pintou foram as bailarinas, às quais dedicou mais tempo e às quais deve a melhor parte de sua fama.
   Com perseverança, tenacidade e curiosidade crescente, ele analisou cada um de seus gestos, movimentos, atitudes e posturas. De frente e por trás, de perfil ou viés, antes, durante e após o balé. Focalizou sua leveza, equilíbrio, agilidade, o esforço e a tensão da dança. Retratou-as atando as sapatilhas, sozinhas ou em grupo, em repouso ou exaustas após um ensaio ou espetáculo.
   Em algumas telas empregou linhas geométricas de arquitetura para subdividir o espaço em áreas onde arranjava as figuras com agudo senso de perspectiva.
   Degas nunca se casou. Mas as mulheres sempre foram o motivo principal de sua arte. Ele as usou para transmitir à posteridade um vislumbre de sua concepção pessoal da realidade e da vida cotidiana da sociedade de seu tempo. Passadeiras e lavadeira que trabalham em Montmartre, mulheres pesadamente maquiladas que passavam as tardes em cafés ou salões de beleza, meretrizes e cortesãs se banhando ou se penteando, mulheres de cena ou platéia em teatro, todas interessavam a sua visão meticulosa, mas descomprometida, isenta da sensualidade do voyeur.
   Ente 1876-77, Degas produziu suas obras mais importantes, entre as quais “Absinto” e “Café-Concerto Les Ambassadeurs”. Estas representam duas cenas parisienses que Degas bem conhecia. Cabarés e cafés de Paris eram parte do mundo dele.
   Degas pretendia expor em “Absinto”, com uma nota de denúncia moralista, o contraste entre essa atmosfera festiva, com tanta gente animada, e solidão que muitas vezes oprimia os protagonistas de seus quadros. Os dois personagens entorpecidos e emudecidos pela bebida atestam uma realidade marginal do “fin de siècle”.
   Em “Café-Concerto Lês Ambassadeurs”, Degas recorre a uma fórmula expressionista que leva ao impiedoso exagero do aspecto grotesco da cantora. Pode-se dizer o mesmo de “Cabaré”, pintado em 1876.
   O pintor não parava aí, utilizou-se de novas técnicas e variados meios de expressão. Nanquim, guache e aquarela eram apenas alguns dos recursos, e os mais simples. Inventou “monótipos”, desenhos que fazia recobrindo uma chapa de cobre com preto não oleoso, para depois nela criar uma imagem, com luz e sombra definidas a pincel duro ou trapo.
   Mais tarde, depois da morte de Manet, ele adotou técnicas mais próximas das impressionistas e continuava a experimentar.
   O que mais lhe interessava era o problema de representar o espaço. Os elementos enquadravam-se harmoniosamente, arranjados em composição perfeita, na qual as linhas cortavam e dividiam o campo em seções regulares, cada uma delas estudada em separado.
   Degas também se interessou pela escultura, “arte de homem cego”, assim Degas chamava a escultura. Quase cego, ele dependia do toque para moldar figurinos de cera de dançarinas e cavalos, que foram copiados em bronze após a sua morte. Enquanto Renoir comentava sobre as esculturas de Degas: “Desde Chartres até hoje, tivemos apenas um escultor: Degas. Aquele que fez as catedrais pode dar-nos a idéia da eternidade, a preocupação da época. Degas encontrou meio de exprimir a doença de nossos contemporâneos, devo dizer, o movimento. Somos inquietos, e inquietos são os cavalos e cavalheiros de Degas.”
   Conforme os olhos enfraqueciam, as cores de Degas se intensificaram, e ele simplificou as composições. Nos últimos pastéis, afrouxou a forma de manipular os pigmentos, fazendo-os explodir em riscos livres, vigorosos, em cores vivas, colocadas juntas para provocar o impacto de ambas. Ele fazia contornos decisivos nas formas, preenchendo-as com manchas de cor pura. Como sempre, os quadros de nus parecem apresentar um arranjo casual; tendo sido, entretanto, a estrutura subjacente, composta com firmeza e audácia.
   Os últimos anos de Degas não foram felizes. Os olhos embaçavam as imagens e acabaram por se tornar opacas.
   Morreu cego, aos 83 anos de idade. Muitos preferem lembrar-se dele como descrito por um amigo, Paul Lafond: “fronte alta, larga e arredondada, coroada pelo sedoso cabelo castanho; olhos vivazes, astutos e inquisitivos, sombreados por sobrancelhas circunflexas: boca fina e inteligente sob a barba macia”.